sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Voar com o vento


Quando eu era criança, era muito, muito magrinha. Depois de muitas consultas em tudo que é tipo de médico, em viagens aos especialistas das maiores cidades do Rio Grande do Sul, chegou-se a um incrível diagnóstico de que isso era normal. Eu só era magrinha e isso não era uma doença. Ponto.
Mesmo assim, passei a infância tomando estimuladores de apetite e poções com leite condensado e ovo de codorna, o que pode explicar um pouco a minha loucura por leite condensado, se é que gostar de leite condensado precisa de alguma explicação, não é?
Bem, tudo nisso é só para chegar nessa pequena história: eu tinha cerca de três anos e ameaçava chover. Minha mãe correu para fora, para retirar as roupas da cerca, estava naquelas cercas de arame farpado, bem antigas. Eu corri junto, para ajudar. Lembro que ventava muito, ainda mais que a cerca era ao lado do corredor por onde passava o nosso carro. Me aproximei do local, a ventania aumentou e, de repente, o vento me levou para o chão.
O episódio rendeu muita risada e durante anos, para descrever a magreza infantil, diziam que eu era tão magra que fui levada pelo vento.

Corta para dois de novembro de dois mil e doze. Faz sol. Sem vento nenhum. Mas mesmo sendo um dia lindo, hoje é Finados e é inevitável pensar na morte, até mesmo falar sobre isso, lembrar das pessoas queridas que já foram, visitar os cemitérios.
Depois da nossa ronda em volta dos túmulos, não penso em lápides concretas e pesadas. Penso em cinzas. Dessas muitas cinzas que caem bem devagar, degustando ao máximo a lei da gravidade.
Ser levada pelo vento foi leve, uma boa sensação.




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